Coronavírus: Exercício de Retirada de Sócio e Pagamento de Haveres
Coronavírus: Exercício de Retirada de Sócio e Pagamento de Haveres

Coronavírus: Exercício de Retirada de Sócio e Pagamento de Haveres

28/03/20

Em uma situação normal, um sócio que deseja se retirar de uma sociedade da qual faz parte receberá a quota que lhe é devida calculada com base na situação patrimonial da sociedade à data da resolução, de acordo com o artigo 1.031 do Código Civil. Essa data, segundo o artigo 605, II, do Código de Processo Civil, é o sexagésimo dia seguinte à notificação de saída apresentada pelo sócio retirante, sendo essa a data-base para a apuração de seus haveres. O Superior Tribunal de Justiça consolidou tal entendimento, sendo um exemplo de aplicação do artigo o REsp 1.602.240-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 6/12/2016, DJe 15/12/2016.

Supondo-se, então, que um sócio notificou sua saída no dia 28 de janeiro de 2020, seus haveres serão calculados em relação à situação patrimonial da sociedade no dia 28 de março de 2020, data da resolução. Tal fato ocorreria da maneira descrita, sem grandes intercorrências. Contudo, a Pandemia provocada pelo Coronavírus pode afetar também o exercício de retirada de sócios e o pagamento de seus haveres.

A razão para a mencionada alteração é que a apuração de haveres a ser realizada em um momento de urgência, como o enfrentado agora, pode trazer prejuízos para o sócio que se retira da sociedade e para a sociedade em si, que é quem tem o dever de pagar. Isso porque o Coronavírus tem provocado um efeito dominó, mudando padrões de produção, o cumprimento de obrigações e desacelerando o setor de serviços e também os mercados. Assim, se a data-base para a apuração for nos dias atuais, o balanço patrimonial apresentará um resultado imprevisível e diferente daquele quando do envio da notificação.

A alteração no resultado do balanço patrimonial ocorrerá porque a desaceleração no funcionamento de uma sociedade, devido à necessidade de distanciamento social causada pelo Coronavírus, reduz o seu faturamento. No entanto, suas despesas permanecem as mesmas, mantendo, consequentemente, seu passivo e reduzindo seu patrimônio líquido. Nesse cenário, a parte que cabe a cada sócio acaba também sendo afetada e influenciando no cálculo do balanço patrimonial.

Nesse contexto, deve-se lembrar dos artigos 607 do Código de Processo Civil e 393 do Código Civil. O primeiro estabelece que a data da resolução pode ser alterada a pedido de uma das partes, antes do início da perícia. Seu entendimento e aplicação foram consolidados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, como observado na Apelação Cível 0000779-80.2012.8.26.0083; Relator (a): Grava Brazil; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de Aguaí – Vara Única; Data do Julgamento: 17/03/2020; Data de Registro: 17/03/2020. Essa apelação é um exemplo de como as partes podem requerer a alteração da data de resolução, pedido que será apreciado pelo juízo de origem. O segundo artigo determina que fenômenos imprevisíveis, os chamados, genericamente, “casos fortuitos” ou de “força maior”, podem interromper ou alterar, sem prejuízos, o cumprimento de obrigações.

Assim, para evitar prejuízos na apuração de haveres, indica-se como possível solução o pedido de alteração da data de resolução, comprovando-se expressamente que os efeitos causados pela Pandemia do Coronavírus atingirão o balanço patrimonial da sociedade e, consequentemente, prejudicarão a retirada do sócio, sem que nada possa ser feito em relação a isso.

Sugerimos, portanto, que a data do recebimento da notificação extrajudicial por meio da qual se exerceu o direito de retirada seja definida como data da resolução contratual, de modo a estabelecer como sendo esta a data-base para apuração de haveres.