Societário

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  • Uma alternativa à distribuição de dividendos: capitalização de lucros mediante a emissão de ações preferenciais resgatáveis

    Uma alternativa à distribuição de dividendos: capitalização de lucros mediante a emissão de ações preferenciais resgatáveis

    A nova Lei 15.270/2025, que reintroduziu no Brasil a tributação de dividendos e instituiu a tributação mínima para altas rendas, tem gerado grande comoção entre as empresas, que precisam, pelo texto sancionado, deliberar até 31 de dezembro de 2025 a distribuição dos lucros auferidos até o final do exercício de 2025, para que gozem da isenção vigente atualmente, desde que os dividendos sejam pagos até 2028.

     

    Não é surpresa nem segredo que, por uma série diversa de razões, nem sempre o saldo de lucros acumulados da companhia encontra-se disponível, pois geralmente já foram objeto de reinvestimento e encontram-se alocados em outras contas, que não no caixa ou em investimentos, para que a companhia os pague no curto prazo.

     

    Isso tem aguçado a criatividade do mercado e revolvido mecanismos adormecidos da Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76).

     

    Um dos mecanismos que tem sido aventados é a capitalização das reservas mediante a emissão de ações bonificadas, ou seja, com o aumento de capital, novas ações seriam distribuídas gratuitamente aos acionistas, proporcionalmente ao número de ações que cada acionista possui, nos termos dos artigos 169 da LSA.

     

    As ações bonificadas, desde que atribuídas proporcionalmente aos acionistas, podem ser emitidas em espécie e classes diversas das ações originalmente detidas pelos acionistas, o que dá liberdade à companhia de, por exemplo, emitir ações preferenciais bonificadas, com direito de resgate, pela companhia, nos termos e condições prefixados no ato da emissão.

     

    Dessa forma, o acionista receberia novas ações preferenciais, de classe especial, da sociedade anônima, com o direito ao resgate – que é a operação pela qual a companhia retira definitivamente de circulação uma classe ações mediante o pagamento do seu valor ao acionista – na forma especificada no estatuto social no momento da emissão das novas ações.

     

    Isso dá à companhia, por exemplo, a oportunidade de beneficiar os acionistas com novas ações, antecipando a tributação futura de dividendos, que serão resgatadas de acordo com os prazos previstos pela companhia, conforme a sua possibilidade de pagamento, o que poderá ocorrer a partir das reservas de lucros futuras ou mesmo mediante redução de capital, na medida em que o resgate, uma vez previsto, torna-se um direito expectativo do acionista, a materializar-se nos termos e condições do estatuto.

     

    A companhia, ainda, deverá prefixar no momento de emissão das ações bonificadas qual será a forma de avaliação das ações no momento do resgate, que poderá ser livremente estabelecida, desde que não prejudique a companhia ou os acionistas, inclusive podendo prever a outorga de prêmio decorrente do resgate compulsório das ações.

     

    Assim, revolve-se mais uma possibilidade de planejamento das companhias neste fim de 2025, que poderá gerar grandes benefícios aos acionistas a longo prazo, em razão do recebimento de ações bonificadas resgatáveis, de outra banda, poupar a companhia da necessidade do pagamento imediato de dividendos, ou até 2028, substituindo-o pelo eventual resgate futuro das ações, conforme previsto no momento de sua emissão.

  • Qual a melhor forma de proteger a relação entre os sócios ?

    Qual a melhor forma de proteger a relação entre os sócios ?

    A elaboração de um bom contrato social é o primeiro passo para o empresário que deseja diminuir a possibilidade de conflitos societários, pois define claramente os direitos e deveres de cada sócio, estabelece regras para a tomada de decisões e prevê mecanismos de resolução de conflitos. Essa estrutura clara ajuda a evitar mal-entendidos e disputas, promovendo um ambiente interno mais estável e harmonioso.

     

    Um contrato social bem elaborado é um investimento na saúde da sociedade e na relação entre os sócios, evitando conflitos e promovendo um ambiente de negócios mais seguro e transparente para todos os sócios.

     

    Mais que isso, o que protege a relação dos sócios é a transparência das informações. Algumas delas estão dispostas no contrato social, como dito, porém há uma série outras disposições que os sócios podem fazer a fim de regular sua relação, que não precisam estar dispostas neste documento que vai a registro público.

     

    Para tanto, o acordo de sócios se mostra como mais uma ferramenta apta a proteger a relação societária, conferindo aos sócios a transparência das regras determinadas para a gestão da sociedade, servindo como um verdadeiro “manual de instruções”, balizando entre os sócios os seus poderes, seus deveres e direitos, que extrapolam a relação pública da sociedade com o mercado.

     

    Por isso, além do contrato social também é recomendável formalizar o Acordo de Sócios que poderá tratar de questões individuais do negócio e da relação societária, regras sobre ingresso e retirada de sócios, sucessão da gestão e patrimonial, avaliação da sociedade em operações de venda de participação, entre tantos outros temas que podem evitar futuros impasses.

     

    A melhor forma de mitigar riscos de conflitos societários é tratar com transparência os temas sensíveis para os sócios, de modo que fiquem claras as competências de cada um e como deverão ser os comportamentos diante das situações desafiadoras da gestão de uma sociedade em conjunto.

     

    As conversas difíceis não desaparecerão, mas serão menos complexas a partir da utilização das regras que foram estabelecidas na constituição do negócio, conferindo aos sócios a segurança para desempenharem suas funções e atividades, certos de que o quanto ajustado nos documentos societários será cumprido para ambos os lados.

     

    Sendo assim, é bastante importante contar com o auxílio de uma assessoria jurídica especializada e experiente no tema, para que a empresa esteja protegida dos conflitos dos sócios e que possa cumprir com seu objetivo social, gerando lucro para os sócios e fomentando o mercado.

     

  • Apuração de haveres na dissolução parcial da sociedade e metodologias aplicáveis

    Apuração de haveres na dissolução parcial da sociedade e metodologias aplicáveis

    Na constituição de uma sociedade, os sócios representam o seu cerne e são o que a estrutura, de modo que qualquer alteração na composição societária gera impactos relevantes para os sócios e, principalmente, para a sociedade.

     

    Nesse contexto, diante de uma situação de dissolução parcial, isto é, a retirada, falecimento ou exclusão de um dos sócios, verifica-se que, quando há uma lacuna quanto à metodologia adequada para a apuração de haveres, ou seja, qual critério deveria ser adotado para fixar o valor a ser pago ao sócio retirante, seja pela incompletude da redação contratual, seja pela remissão aos termos do Código Civil, os sócios debatem sobre a aplicação dos dois métodos mais comuns: o Balanço de Determinação e o Fluxo de Caixa Descontado.

     

    De forma sintetizada, com a dissolução parcial da sociedade, o sócio retirante, excluído ou os herdeiros do sócio falecido fazem jus ao recebimento da quota-parte (haveres) que lhe pertence, correspondente ao valor que lhe cabe no patrimônio líquido da empresa, a ser apurado na forma do contrato social ou da legislação vigente. Tal apuração de valores constitui, portanto, a concretização de seu direito patrimonial, sendo de fundamental importância que as regras de avaliação das quotas sociais estejam previstas no contrato social, de forma expressa, clara e completa.

     

    Caso haja lacunas, omissões ou imprecisões quanto à metodologia de apuração dos haveres, caberá ao juiz fixá-la e designar a realização de perícia contábil, cuja função será elaborar o balanço de apuração de haveres, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos.

     

    Embora existam diversos métodos reconhecidos para a apuração de haveres, os quais podem ser aplicados de forma isolada ou complementar, o Balanço de Determinação e o Fluxo de Caixa Descontados, são os mais utilizados.

     

    O Balanço de Determinação evita o enriquecimento sem causa, uma vez que não contempla a perspectiva de recebimento de lucros futuros, aos quais o sócio desligado não mais contribuirá nem participará. Ao mesmo tempo, o método reconhece a valorização real da empresa ao longo do período em que o sócio esteve presente, assegurando que o valor inicialmente investido por ele seja atualizado conforme o crescimento patrimonial efetivo ocorrido durante sua participação societária.

     

    No âmbito dessa metodologia, dois princípios fundamentais são observados para a avaliação dos ativos e passivos da sociedade: o Valor de Mercado, que representa o preço estimado pelo qual determinado bem poderia ser negociado em condições normais de mercado; e o Valor Presente, que consiste na atualização dos fluxos financeiros futuros esperados, descontados a uma taxa que reflita adequadamente o risco e o custo de oportunidade do capital.

     

    O outro método comumente utilizado para essa apuração é o do fluxo de caixa descontado (FCD), que se propõe a mensurar a capacidade de geração futura de riqueza da empresa. A essência dessa metodologia consiste em projetar os fluxos de caixa operacionais esperados para os períodos futuros e trazê-los a valor presente, utilizando-se de uma taxa de desconto apropriada, que reflita o risco inerente ao negócio e o custo de oportunidade do capital investido.

     

    Embora esse método possa resultar em uma valorização mais expressiva da participação do sócio retirante, ao considerar ganhos futuros, ele não se revela vantajoso para os sócios remanescentes ou para a própria sociedade, que continuará existindo e assumirá os riscos e encargos necessários à geração dos lucros projetados, sem a participação do sócio em relação ao qual a sociedade tenha se dissolvido.

     

    O tema, apesar de aparentemente claro, demanda reiterada apreciação pelo Poder Judiciário. Recentemente, no julgamento do Recurso Especial n.º 2.063.134 – MG, o Superior Tribunal de Justiça reafirmou a posição de que o Balanço de Determinação deve prevalecer como critério principal de apuração de haveres, na esteira do que já havia definido nos Recursos Especiais nº 1.892.139 – SP (julgado em 08/10/2024), 1.904.252 – RS (julgado em 22/08/2023) e 1.877.331 – SP (julgado em 13/04/2021), por se tratar da metodologia que melhor representa a situação patrimonial da empresa no momento de sua dissolução, possibilitando a apuração precisa do montante devido ao sócio retirante.

     

    Observa-se, portanto, que os sócios, após constituída a sociedade, ficam todos umbilicalmente vinculados por meio do contrato social, que, por sua vez, deve conter todos os termos que regularão a vida societária e sua dissolução, de forma clara e objetiva, para que, não apenas atraia a necessária segurança jurídica, mas também sirva como parâmetro interpretativo para a resolução de eventuais controvérsias, como as mencionadas acima.

     

    Por essa razão, o contrato social deve ser elaborado desconsiderando fórmulas prontas, nascedouro de conflitos, mas construído de forma colaborativa entre os sócios, refletindo a realidade societária e a verdadeira vontade dos sócios, evitando controvérsias que possam comprometer sua eficácia, gerando longas disputas judiciais e graves prejuízos à sociedade.

     

  • Como a Reforma do Código Civil Pode Afetar a Sua Empresa

    Como a Reforma do Código Civil Pode Afetar a Sua Empresa

     

    O Projeto de Lei 4/2025, em trâmite no Congresso Nacional, objetiva uma série de modificações no Código Civil, que preocupam, especialmente, no ponto de vista societário.

     

    A proposta de alteração que aqui mencionamos trata da forma de apuração de haveres do sócio que se retira, motivada ou imotivadamente, da sociedade.

     

    O ponto de atenção da reforma é a verdadeira confusão que se fez em relação às datas para a resolução do vínculo societário. O que hoje é bastante claro na legislação, uma vez que o Código de Processo Civil foi utilizado para sanar das verdadeiras incongruências da jurisprudência, será totalmente arruinado pela reforma em trâmite.

     

    A proposta de redação afeta a clareza da legislação, estabelecendo datas diversas para se considerar o encerramento do vínculo societário, o que por óbvio pode gerar prejuízos não só às sociedades, como aos sócios retirantes e aos que permanecem.

     

    Há muito se buscava a consolidação das datas de desfazimento do vínculo social, pois enquanto havia divergência, os sócios retirantes ficavam vinculados às sociedades, quando já não o queriam mais, e ainda, permaneciam com direitos de políticos e econômicos, o que acarretava uma série de problemas para a sociedade e sócios.

     

    A proposta de alteração da redação dos art. 1.029, 1.031 e 1086 revela um descompasso entre a legislação material e a processual no que diz respeito ao rito processual da dissolução societária, incorrendo a falta técnica numa problemática que colocará os processos de apuração de haveres em um longo e moroso trâmite.

     

    Se o processo já leva em média 4 anos para tramitar e ser resolvido, com dúvidas em relação ao marco da saída, quanto tempo levará para que a sociedade tenha o número que tanto se espera para pagamento dos haveres?

     

    Mais grave ainda é a possibilidade de dissolução da sociedade empresária em caso de dissolução do casamento. Há uma interferência invasiva no interesse particular da sociedade e de seus sócios. Não é porque o casamento se desfez que a sociedade também deverá ser desfeita. Existem muitos interesses ao redor da sociedade para que uma decisão íntima do casal gere, automaticamente, a dissolução da sociedade empresária.

     

    É por este motivo, que mais uma vez, ressalto a importância da revisão dos contratos sociais das sociedades. De tempos em tempos é necessária a revisão e a atualização das cláusulas contratuais, para se buscar melhor resguardar os interesses de todos os participantes da vida da sociedade, seja ela própria, seja de seus sócios.

     

    Aquilo que é combinado com clareza traz segurança para os sócios e minimiza o risco de questionamentos ou até mesmo disputas societárias.

     

    Ao deixar o contrato social da sua empresa atualizado, se garante que, num cenário como este de reforma de uma legislação que ainda não tem uma consolidação jurisprudencial, todas as partes envolvidas estarão protegidas e amparadas, ainda que a lei seja reformada de maneira a tumultuar e não solucionar as dores dos empresários.

     

    Se o contrato social da sua empresa não está atualizado ou merece uma revisão, mínima que seja, procure um advogado para fazer essa análise, pois só ele tem condições de prevenir os riscos a que a sociedade os sócios podem estar expostos.

  • Planejamento patrimonial e reforma tributária

    Planejamento patrimonial e reforma tributária

    Sensível a todos que empreendem, o atual sistema tributário brasileiro tem enfrentado diversas críticas desde sua instituição, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que, muito embora tenha trazido importantes avanços relativos à descentralização de receitas com relação à União, Estados e Municípios, contribuindo com a redução de desequilíbrios regionais, se mostrou excessivamente complexo, burocrático, ineficiente no que diz respeito à concentração de renda e demasiadamente oneroso.

    Neste cenário, tornou-se comum discussões sobre planejamento tributário e patrimonial, mecanismo pelo qual, utilizando-se de ferramentas lícitas (elisão fiscal), o contribuinte busca reduzir sua carga tributária em sua atividade produtiva, bem como em suas operações pessoais e na organização de seu patrimônio, até mesmo para viabilizar uma sucessão mais tranquila e menos onerosa aos herdeiros.

    Sob a ótica do planejamento patrimonial, sempre estiveram em evidência o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis – ITBI e o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD, o primeiro, de competência dos municípios, o último, de competência dos estados.

    Isso porque, quando se pensa em transferência onerosa de patrimônio imobiliário, fala-se, invariavelmente, em ITBI, com recente discussão sobre a incidência do referido tributo em operações de integralização de bens imóveis para constituição de sociedades sem preponderância de atividade imobiliária, nos casos em que há divergência entre o valor declarado na integralização e o valor venal considerado pelo município.

    Já quando se pensa na transmissão gratuita de bens, como a doação de bens de pai para filhos ou netos, ou em casos de falecimento, há a incidência do ITCMD.

    Oportuna, portanto, a análise da incidência dos referidos tributos nas operações de planejamento patrimonial e sucessório sob a luz das mudanças previstas no texto da PEC 45/2019, que propõe a reforma tributária.

    Quanto ao ITCMD, atualmente, além de uma faixa de isenção, vigora uma alíquota única, fixada pelos estados, independentemente do valor do bem. Em outras palavras, em caso de doação ou herança, sendo o bem objeto a ser transmitido avaliado em R$100.000,00 ou R$1.000.000,00, o cálculo do imposto devido será realizado por meio de utilização de uma mesma alíquota, com exceção de estados como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, no qual já existe progressividade de alíquotas.

    Com a nova regra trazida pela PEC 45/2019, haverá uma progressividade na fixação de alíquotas do ITCMD, de modo que, quanto maior o valor do patrimônio doado ou herdado, maior será a alíquota do imposto incidente na transmissão dos bens (art. 155, §1º, VI – PEC).

    Com relação à competência para exigência do tributo, esta deixa de ser no local onde se processa o inventário ou no foro de situação do bem, no caso de doação, passando para o local de residência do doador ou do falecido.

    Outro ponto de mudança no ITCMD consiste no início de sua incidência sobre heranças no exterior. Neste caso, se o falecido deixar como herança bens no exterior, o imposto será devido no estado de residência do falecido. Caso o falecido more no exterior, o imposto será devido no estado no qual reside o herdeiro.

    Vale dizer que a cobrança do ITCMD sobre herança de bens no exterior não é bem uma novidade, na medida em que já guarda previsão no artigo 155, §º, III, da Constituição, todavia, não chegou a ser posta em prática em razão da ausência de lei complementar regulamentando a matéria, tal qual exigido pelo texto constitucional.

    Muito embora ainda não tenham sido fixadas as alíquotas e faixas de progressividade do ITCMD, o que nos impede, neste momento, de aferir com precisão o impacto tributário da reforma em tais operações, fato é que, com o objetivo de se atingir uma tributação mais ajustada à capacidade contributiva de cada cidadão, a tendencia é a manutenção (ou até mesmo uma leve redução) nas alíquotas do ITCMD incidentes sobre heranças cujo valor se encontrará na primeira faixa de tributação (bens de menor valor) e um aumento progressivo na alíquota do referido tributo sobre heranças de valores mais expressivos, seguindo o exemplo de outros países do mundo, nos quais, após uma primeira faixa de isenção, há progressividade nas alíquotas até o atingimento de um limite máximo, que no Chile é de 20%, na Espanha 34%, na França 45%, nos Estados Unidos 40%, Alemanha 50%, e na Bélgica o exorbitante percentual máximo de 80%.

    Com relação ao ITBI, um tributo cuja incidência em operações envolvendo a integralização de bens imóveis no capital social de pessoas jurídicas tem ganhado destaque no judiciário em decorrência da diversidade de interpretações do Tema 796 do Supremo Tribunal Federal e do Tema 1113, do Superior Tribunal de Justiça.

    Há de se destacar que, muito embora o artigo 148 do Código Tributário Nacional traga uma presunção de veracidade do valor do bem declarado pelo contribuindo no momento de sua transmissão, o qual somente poderia ser afastado mediante regular procedimento administrativo de iniciativa do ente tributante, a prática tem demonstrado que os municípios têm adotado como base de cálculo do tributo não o valor declarado pelo contribuinte na operação, mas sim o valor venal para fins de IPTU, daí porque as mudanças nas regras de tributação deste imposto, trazidas pela reforma tributária, também podem impactar os planejamentos patrimoniais.

    Com a reforma tributária, a atualização do valor venal dos imóveis pela municipalidade é simplificada, podendo ocorrer por meio de decreto municipal (art. 156, §1º, III – PEC), dispensando a necessidade de edição de lei para este fim.

    Neste cenário, imóveis com valorização significativa devem ser alvo de revisão de valores. Considerando o valor venal para fins de IPTU como base de cálculo para cobrança do ITBI, como têm feito os municípios, pode-se concluir que o valor do ITBI também será afetado, sendo possível a majoração do valor do tributo em decorrência do aumento/correção do valor de sua base de cálculo.

    Seja diretamente, como no caso do ITCMD, com possível majoração das alíquotas aplicáveis àqueles de maior poder aquisitivo, seja indiretamente, como no caso do ITBI, com reajuste do valor considerado na base de cálculo do tributo, fato é que a reforma tributária irá movimentar o cenário no qual se inserem os planejamentos patrimoniais.

    A vigência destas alterações, em específico, se dará com a publicação do texto da emenda constitucional relativa à reforma (PEC 45/2019), ou após o prazo de vacacio legis – uma espécie de “carência” – eventualmente prevista.

    Aprovado na Câmara dos Deputados na madrugada de 7 de julho de 2023, o PEC 45/2019 segue para análise e votação no Senado Federal, que está prevista para ocorrer até novembro de 2023. Havendo modificações no seu texto, a proposta voltará à análise da Câmara na parte alterada. O texto integral seguirá para promulgação após aprovação em ambas as casas.

    É por isso, que mais uma vez o planejamento patrimonial se mostra importante e necessário, como forma de melhor acomodar os interesses pessoais dos proprietários, e neste cenário de mudanças, permitirá que seja realizado de maneira menos custosa, sob o aspecto tributário.

  • papel na mesa com martelo juridico e casa

    Impenhorabilidade do bem de família integralizado a uma holding patrimonial à luz do entendimento do STJ

    A holdings patrimoniais são pessoas jurídicas constituídas em sua maioria com a finalidade de facilitar a administração do patrimônio imobiliário de uma pessoa ou grupo de pessoas, já visando também o planejamento sucessório das famílias que possuem diversos imóveis e demais bens, a partir do estabelecimento de regras de gestão e utilização desses bens. Dentre as principais vantagens para a criação de uma holding patrimonial, destacam-se a melhor administração do patrimônio, o aumento da proteção dos bens em casos de casamento e divórcio, aprimoramento do planejamento sucessório e vantagens tributárias, entre outras.

     

    Em razão do aumento expressivo e constante do número de holdings patrimoniais que vêm sendo constituídas no Brasil ao longo dos anos, também vêm crescendo a discussões sobre sua natureza e a forma de lidar com os bens inseridos nesse tipo de sociedade. Dentre os debates travados, verifica-se a discussão sobre a penhorabilidade do bem de família pertencente às pessoas jurídicas, como o caso do imóvel utilizado como moradia por familiares e integralizado por um desses em uma holding patrimonial, que tem como sócios justamente os próprios familiares que residem em tal imóvel.

     

    No Brasil, é considerado bem de família o imóvel que serve de residência à entidade familiar, sendo protegido legalmente pelo Código Civil e pela Lei nº 8.009, que dispõe sobre a impenhorabilidade do imóvel destinado a esse fim. Desse modo, o artigo 1º da Lei 8.009/90 prevê que o imóvel considerado como bem de família, que goza de proteção extra, não pode responder por nenhum tipo de dívida, em atenção ao direito social à moradia, previsto no artigo 6º, caput, da Constituição Federal de 1988, à proteção do patrimônio mínimo do devedor e impedindo o credor de levar o devedor à miséria, privilegiando o princípio da dignidade da pessoa humana.

     

    Ademais, segundo o art. 5º da referida Lei, para os efeitos da impenhorabilidade, considera-se como residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente.

     

    Por conta das inúmeras previsões legais e dificuldades que permeiam o assunto, em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial nº 1.514.567/SP, no qual se discute a possibilidade de invocação da proteção ao bem de família, quando se trata de imóvel de pessoa jurídica. No caso concreto analisado, houve a desconsideração da personalidade jurídica de sociedade familiar, cujas cotas inteiramente pertenciam aos únicos devedores que residem em imóvel integralizado na sociedade, em função da confusão patrimonial entre a pessoa jurídica e seus sócios, hipótese prevista no §2º, art. 50 do Código Civil.

     

    Assim, durante a fase de cumprimento de sentença se constatou que os bens pertencentes aos devedores se limitavam à integralidade das quotas sociais de uma holding patrimonial. Por essa razão, a credora requereu a penhora e avaliação patrimonial das quotas da referida sociedade.   O pedido de penhora foi deferido pelo Juízo, havendo a realização e o registro da penhora, que foi impugnada pelos devedores, a partir do fundamento da impenhorabilidade em razão do fato de que o único ativo da sociedade se tratava de um imóvel no qual os devedores e sua família residiam há 20 (vinte) anos. Ademais, argumentou-se que o imóvel não pertencia às pessoas físicas e sim à pessoa jurídica. Por conta disso, sobreveio decisão determinando a impossibilidade da aplicação da impenhorabilidade do bem de família a partir da Lei 8.009/90.

     

    Remetida a questão ao Superior Tribunal de Justiça, por meio do Recurso Especial de nº 1.514.567/SP, retomou-se o seguinte entendimento “a impenhorabilidade da Lei nº 8.009/90, ainda que tenha como destinatários as pessoas físicas, merece ser aplicada a certas pessoas jurídicas, às firmas individuais, às pequenas empresas com conotação familiar, por exemplo, por haver identidade de patrimônios.” (FACHIN, Luiz Edson. “Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo”, Rio de Janeiro, Renovar, 2001, p. 154).

     

    Referida decisão do STJ se deu sob o argumento de que é necessário analisar a demonstração da boa-fé do sócio morador que tem o imóvel como sua residência desde antes do vencimento da dívida, circunstância que deve ser avaliada no caso concreto. Por conta disso, o recurso especial foi provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, onde será analisada a prova dos autos a respeito da alegação de residência no imóvel dos sócios da empresa devedora.

     

    Portanto, caso, nos autos de origem, seja provado que o imóvel é o de residência da família, será aplicável ao imóvel registrado em nome da pessoa jurídica a proteção da Lei 8.009/90, pois o STJ firmou entendimento de que é “inviável a penhora do único imóvel onde reside a família do sócio, ainda que o bem se encontre em nome da pessoa jurídica, considerado o fato de a sociedade empresária ser eminentemente uma estrutura familiar, como sucede na espécie.”

  • três mãos se tocando encima de uma mesa

    Política Integrada de Governança e Responsabilidade Socioambiental (ESG) da ANS: o ESG enquanto pauta regulatória

    Em 21 de março de 2023, a ANS publicou a Resolução Administrativa nº 82/2023, dispondo a respeito da Política Integrada de Governança e Responsabilidade Socioambiental (ESG) que deverá nortear as relações estabelecidas entre a ANS e suas partes envolvidas.

     

    A Resolução, em seu artigo 5º, II, indica como um dos objetivos desta política a adoção de um sistema de comunicação eficiente, visando disseminar os conceitos de governança e de sustentabilidade a todas as partes envolvidas, com a possibilidade de publicação de guias, manuais e outros instrumentos que busquem direcionar a adoção de boas práticas que integrem as perspectivas.

     

    Dessa forma, é de suma importância que as operadoras de plano de saúde estejam alinhadas com as diretrizes e o planejamento do próprio órgão regulador, ainda que não haja, por ora, nenhuma obrigatoriedade de implementação ou observância das diretrizes e objetivos que serão adotados pela própria ANS em suas relações internas e com as partes envolvidas.

     

    Para além disso, é importante que as operadoras se alinhem não apenas ao projeto regulatório envolvendo à temática ESG, mediante o fortalecimento das estruturas de governança, mas também mediante a inclusão da pauta social e ambiental nos programas e integridade e compliance enquanto exigências de mercado, cada vez mais atento ao cumprimento normativo e à adoção de pautas inclusivas e ambientais.

     

    Já pensou em como é possível atualizar ou implementar o seu programa de compliance à pauta ESG? Para isso é bastante importante contar com o auxílio de uma assessoria jurídica especializada e experiente no tema, para que a construção do seu programa seja sólidao e sustentável.

  • aperto de mao

    Governança Cooperativa: desafios e importância

     

    As cooperativas são sociedades de pessoas estruturadas sobre a pedra fundamental do solidarismo em que prevalece a dimensão humana do trabalho e a supressão do capital como forma de atribuir ao cooperado dignidade, incrementando-lhe a renda, promovendo inserção social e formação cultural. O cooperativismo moderno é um ramo importante para a economia brasileira, movimentando cifras elevadas, seja no ramo de crédito, de saúde ou agrícola, que somam mais de 18 milhões de cooperados em mais de 4 mil cooperativas registradas na OCB.

     

    Tão robusto sistema, de tamanha importância para a economia nacional (movimentando ativos totais superiores a R$ 784 bilhões) necessita, para que se sustente de forma segura, estável e longeva, de estruturas de governança sólidas, que valorizem o cooperado e sua atividade, aproximem-no da gestão do negócio comum e promovam, internamente, a cultura cooperativista, seus princípios e valores, para perpetuar a atividade social, agregando valor a todos os cooperados e não cooperados que dependem da cooperativa. Isso é a Governança Cooperativa.

     

    A Governança Cooperativa[1] consiste em uma série de práticas de direção cuja finalidade é garantir a consecução dos objetivos sociais de forma ética, eficiente e sustentável, com enfoque nas particularidades e princípios do cooperativismo, pautando-se pela autogestão das cooperativas, senso de justiça, transparência, educação e sustentabilidade.

     

    Na implantação de uma política de governança, todos são alvos e parte ao mesmo tempo, desde o estrato mais individual até o mais amplo. O propósito da estruturação da governança cooperativa é estruturar sistemas seguros de controle dos atos de gestão, internamente, seja pelas estruturas sociais internas (órgãos de gestão e fiscalização), seja mediante a aproximação dos cooperados da gestão, participando-os das decisões assembleares, realizando reuniões prévias das assembleias e formação grupos de debates com cooperados, para a captação e desenvolvimento de ideias pelos órgãos gestores, permitindo que o cooperado participe e assista o processo decisório da cooperativa, e se sinta cada vez mais incluído e engajado com o negócio comum.

     

    Isso, em conjunto com uma divulgação mais forte da convocação das assembleias, permite e estimula os cooperados a participarem mais das Assembleias Gerais, sendo uma solução para a baixa adesão ou pouca representatividade, problemática recorrente em muitas cooperativas, que não raro encontram uma tímida participação de seus associados.

     

    Em relação ao Conselho de Administração ou Diretoria, tendo em vista a complexidade das atribuições, consistentes no planejamento estratégico e no gerenciamento da cooperativa, o juízo de qualificação de seus representantes deve ser rigoroso. Assim, recomenda-se o uso de critérios como a exigência de certificação reconhecida pela OCB. Decorrência natural dessa maior responsabilidade dos cargos, o Estatuto deve sistematizar suas atribuições, delimitar competências e alçadas, prever quóruns e forma de substituição de conselheiros, bem como os requisitos mínimos para que possam se candidatar aos cargos de gestão. Além disso, a avaliação de seus membros, em especial daqueles de maior poder e responsabilidade, pelos demais órgãos é medida necessária para preservar o equilíbrio entre os órgão sociais e robustecer os mecanismos de controle, agregando os Conselhos Técnico e Fiscal à estrutura de suporte, controle e fiscalização dos atos da gestão, no que lhes couber.

     

    Quanto a esses órgãos, a transparência é de suma importância, uma vez que suas deliberações têm grande impacto na cooperativa como um todo, sendo recomendável a realização de algumas reuniões abertas aos cooperados de algumas reuniões do Conselho de Administração, bem como da organização de uma boa comunicação interna, entre a gestão e o corpo de cooperados, como forma continuada de prestação de contas, o que pode se dar pela publicação periódica de relatórios, que tragam descrição minuciosa das atividades da gestão.

     

    O Conselho Fiscal, por sua vez, é o órgão de fiscalização da gestão, obrigatório e de funcionamento permanente em todas as cooperativas, pauta-se pela fiscalização assídua e minuciosa dos atos de gestão, com enfoque na regularidade e legalidade das demonstrações contábeis e operações realizadas pela cooperativa, sendo fundamental para a identificação e reação a más práticas de gestão, cabendo-lhe a elaboração de parecer sobre as contas da administração que será levado à apreciação do corpo de cooperados na Assembleia Geral Ordinária, sendo os olhos e ouvidos do corpo de cooperados junto aos órgãos de gestão, cujas competências e limites devem ser estabelecidos no Estatuto Social e no Regimento Interno de funcionamento do Conselho Fiscal, que vinculará a conduta dos Conselheiros Fiscais, bem como a responsabilidade decorrente do exercício de suas funções.

     

    Existe, ainda, toda uma ampla gama de órgãos e comitês importantes para a manutenção e prosperidade da cooperativa e que ficarão de fora do presente artigo, como os comitês de ética, auditoria interna e externa, secretaria de governança, riscos e Compliance, que se coordenam para robustecer, internamente, as estruturas de controle da atividade cooperativa e dos órgãos de gestão, sendo claro que a criação de uma política de governança bem estruturada traz bons frutos.

     

    A estrutura das cooperativas ainda é um mecanismo importante para a geração de empregos, realização organizada de atividades importantíssimas para o desenvolvimento do país, arrecadação de impostos, fomento do mercado e precisa ser sempre aprimorada, como forma de garantir esse tão almejado crescimento.

     

    O modelo de governança cooperativa interessa a todas aquelas cooperativas que querem continuar em posição de vanguarda no mercado, assegurar sua longevidade e agregar valor aos seus negócios, seguindo os princípios da transparência dos seus órgãos gestores, profissionalização da gestão (grande problema pelo fato das cooperativas serem formadas pela união de profissionais de operação de uma determinada atividade que não necessariamente gestores), a interação com o quadro social para estimular a participação (que pode ser facilitado com os meios da tecnologia da informação difundindo informações da cooperativa), e pela organização da atividade de gestão, agregando eficiência à atividade social.

     

    [1] Conceito elaborado pela OCB em seu Manual de Governança Cooperativa: “Trata-se de um modelo de direção estratégica, fundamentado nos valores e princípios cooperativistas, que estabelece práticas éticas visando garantir a consecução dos objetivos sociais e assegurar a gestão da cooperativa de modo sustentável em consonância com os interesses dos cooperados.”

  • Comunicado JUCESP – Transformação de EIRELI para Limitada Unipessoal

    Comunicado JUCESP – Transformação de EIRELI para Limitada Unipessoal

    Em 07/12/2022, a Junta Comercial do Estado de São Paulo (“JUCESP”) divulgou um comunicado informando que, no período entre os dias 09 e 11/12/2022, realizaria automaticamente a transformação de seu banco de dados e da Receita Federal do Brasil de EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada) para Sociedade Limitada Unipessoal.

     

    Isso porque, como é cediço, com o advento da Lei nº 14.195 de 26 de agosto de 2021, houve a revogação tácita dos artigos 44, inciso VI e 980-A do Código Civil, que previam a existência da EIRELI. Na mesma lei, restou determinado em seu artigo 41 que todas as EIRELI existentes na data de entrada em vigor da lei seriam transformadas em sociedades limitadas unipessoais, independentemente de qualquer alteração em seu quadro constitutivo.

     

    Tal lei está em plena consonância com as mudanças originadas na Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.784/2019), por meio da qual passou a ser permitida a constituição de sociedade limitada por apenas uma pessoa, afastando de vez a própria razão de ser da EIRELI e substituindo o espaço até então ocupado por esse tipo de sociedade composto por quem empreende de forma individual.

    Nesse sentido, o DREI (Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração) expediu o Ofício Circular SEI nº 3510/2021/ME – utilizado pela JUCESP para embasar seu comunicado – determinando que as Juntas Comerciais:

     

    1. a) Incluíssem na ficha cadastral das EIRELI já constituídas a informação de que foi “transformada automaticamente para sociedade limitada, nos termos do art. 41 da Lei nº 14.195, de 26 de agosto de 2021”;
    2. b) Dessem ampla publicidade sobre a extinção da EIRELI e acerca da possibilidade de constituição da sociedade limitada por apenas uma pessoa, bem como realizem as medidas necessárias à comunicação dos usuários acerca da conversão automática das EIRELI em sociedades limitadas; e
    3. c) Abstivessem-se de arquivar a constituição de novas EIRELI, devendo o usuário solicitante ser informado acerca da extinção dessa espécie de pessoa jurídica no ordenamento jurídico brasileiro e sobre a possibilidade de constituição de sociedade limitada por apenas uma pessoa.

    Diante do exposto e considerando que a conversão automática da EIRELI para Sociedade Limitada Unipessoal se dará somente no cadastro da nova empresa na Junta Comercial, recomenda-se que os titulares de EIRELIs já registradas adaptem seus instrumentos de constituição para alterar a forma da sociedade para a Sociedade Limitada Unipessoal, garantindo, assim, a segurança jurídica, a preservação da identidade e da credibilidade da empresa perante o mercado e já preparando-a para eventual crescimento.