Esclarecimentos sobre as Mudanças na Tributação de Investimentos: Análise da Lei nº 14.754/23 e da IN 2.166/2023
Esclarecimentos sobre as Mudanças na Tributação de Investimentos: Análise da Lei nº 14.754/23 e da IN 2.166/2023

Esclarecimentos sobre as Mudanças na Tributação de Investimentos: Análise da Lei nº 14.754/23 e da IN 2.166/2023

30/01/24

Em 13 de dezembro de 2023, foi publicada a Lei nº 14.754, a qual dispõe sobre a tributação de aplicações em fundos de investimento no País e da renda auferida por pessoas físicas residentes no País em aplicações financeiras, entidades controladas e trusts no exterior.

 

Dentre as mudanças instituídas pela publicação da lei, as quais serão pormenorizadas logo abaixo, destacam-se: (a) alteração do imposto de renda das pessoas físicas (IRPF) em relação aos rendimentos de capital aplicado no exterior, nas modalidades de aplicações financeiras e de lucros e dividendos de entidades controladas; (b) a instituição de IRPF automático sobre lucros de entidades controladas no exterior para pessoas físicas residentes no Brasil; (c) estabelecimento do regime de tributação de trusts no exterior; e (d) sujeição dos fundos de investimentos fechados ao recolhimento periódico do IRPF na sistemática “come-cotas”.

 

 

  1. DA TRIBUTAÇÃO DE RENDIMENTOS NO EXTERIOR DE PESSOAS FÍSICAS RESIDENTES NO BRASIL

 

Conforme dispõe a lei, os rendimentos do capital no exterior, consubstanciados nas modalidades de aplicações financeiras, lucros e dividendos de entidades controladas serão computados na Declaração de Ajuste Anual (DAA), separadamente dos demais rendimentos e ganhos de capital.

 

Esses rendimentos derivados de aplicações financeiras no exterior serão tributados pelo IRRF a uma alíquota única de 15%.

 

Vale ressaltar que a lei prevê de modo expresso que não constituem aplicações financeiras no exterior os ganhos de capital percebidos pela pessoa física residente no País na alienação, na baixa ou na liquidação de bens e direitos localizados no exterior que não constituam aplicações financeiras nos termos do art. 3º da lei.

 

  1. ENTIDADES CONTROLADAS NO EXTERIOR

 

De acordo com o art. 5º da lei, os lucros apurados pelas entidades controladas no exterior por pessoas físicas residentes no país serão tributados em 31 de dezembro de cada ano.

 

Serão consideradas como controladas as entidades nas quais a pessoa física possui direitos que assegurem a preponderância nas deliberações sociais ou poder eleger/destituir administradores e também caso a pessoa física possua mais de 50% de participação no capital social ou nos direitos à percepção dos lucros.

 

Além dessas, também serão consideradas como controladas as entidades nas quais a pessoa física possuir mais de 50% de participação no capital social ou nos direitos à percepção de seus lucros.

 

Importante ressaltar que nesse conceito de entidades incluem-se os fundos de investimento, as fundações, pessoas jurídicas e outras entidades, personificadas ou não, com classes de cotas ou ações com patrimônios segregados.

 

A tributação automática irá abranger as entidades controladas, direta ou indiretamente, e que se enquadrarem em uma ou mais das seguintes hipóteses: I – estejam localizadas em país ou em dependência com tributação favorecida ou sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado de que tratam os arts. 24 e 24-A da Lei nº 9.430/1996; ou II – apurem renda ativa própria inferior a 60% (sessenta por cento) da renda total.

 

Os lucros tributados nessa modalidade automática serão incluídos na DAA,  na ficha de bens e direitos, como custo de aquisição de crédito de dividendo a receber da controlada, direta ou indireta, com a indicação do respectivo ano de origem e, quando distribuído para a controladora, irão promover uma redução do custo de aquisição do crédito do dividendo a receber sem serem tributados novamente.

 

Em relação à dedução do lucro da pessoa jurídica controlada, será possível a dedução da parcela correspondente aos lucros e aos dividendos de suas investidas que forem pessoas jurídicas domiciliadas no País.

 

No que tange aos lucros apurados até 31 de dezembro de 2023 pelas controladas no exterior de pessoas físicas residentes no País, restou decidido que serão tributados no momento da efetiva disponibilização para a pessoa física residente no País.

 

De acordo com a lei, efetiva disponibilização consiste no pagamento, no crédito, na entrega, no emprego ou na remessa de lucros, o que ocorrer primeiro; ou em quaisquer operações de crédito realizadas com a pessoa física ou com pessoa a ela vinculada, se a credora possuir lucros ou reservas de lucros.

 

Importante ressaltar que a lei prevê que prejuízos apurados a partir de 01 de janeiro de 2024 e anteriores à apuração dos lucros, poderão ser deduzidos do lucro da controlada. Além disso, perdas realizadas em aplicações financeiras no exterior poderão ser compensadas com lucros e dividendos de entidades controladas no exterior.

 

Há também a possibilidade de dedução do lucro da pessoa jurídica controlada, direta ou indiretamente, a parcela correspondente aos lucros e aos dividendos de suas investidas que forem pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil.

 

O mesmo se aplica aos rendimentos e ganhos de capital feitos no Brasil, desde que sejam tributados pelo IRRF por alíquota igual ou superior a 15%;;

 

  • TRUSTS NO EXTERIOR

 

Por previsão legal, os bens e direitos objeto de trust no exterior serão considerados de titularidade do instituidor após a instituição do trust e passarão à titularidade do beneficiário no momento da distribuição pelo trust para o beneficiário ou do falecimento do instituidor, o que ocorrer primeiro.

 

Ainda, a lei considerou que a distribuição será presumida como doação caso ocorra durante a vida do instituidor ou como transmissão causa mortis, após o seu falecimento.

 

A lei prevê que os rendimentos e os ganhos de capital relativos aos bens e direitos objeto do trust serão submetidos à incidência do IRPF, sendo que os bens e direitos objeto do trust, independentemente da data de sua aquisição, deverão, em relação à data-base de 31 de dezembro de 2023, ser declarados diretamente pelo titular na DAA, pelo custo de aquisição.

 

Caso o titular tenha informado anteriormente o trust na sua DAA, será necessário substituí-lo pelos bens e direitos subjacentes, de modo a se alocar o custo de aquisição para cada um desses bens e direitos, considerada a proporção do valor de cada bem ou direito em relação ao valor total do patrimônio objeto do trust.

 

Ademais, a lei estipula que caso a pessoa que tenha informado anteriormente o trust na sua DAA seja distinta do titular estabelecido por esta Lei, o declarante poderá, excepcionalmente, ser considerado como o titular para efeitos do IRPF.

 

  1. ATUALIZAÇÃO DO VALOR DOS BENS E DIREITOS NO EXTERIOR

 

De acordo com o art. 14 da lei, a pessoa física residente no País poderá optar por atualizar o valor dos bens e direitos no exterior informados na sua DAA para o valor de mercado de 31/12/2023, tributando a diferença para o custo de aquisição, pelo IRRF, à alíquota definitiva de 8% (oito por cento).

 

Essa opção pode ser aplicada às aplicações financeiras, aos bens imóveis em geral ou ativos que representem direitos sobre bens imóveis, veículos, aeronaves e outros exemplos previstos no §1º do art. 14.

 

Há ainda uma ressalva em relação a alguns bens que não poderão ser objeto de atualização, os quais estão previstos no §10º do art. 14, sendo um exemplo os bens ou direitos que não tiverem sido declarados na DAA relativa ao ano-calendário de 2022, entregue até o dia 31 de maio de 2023, ou adquiridos no decorrer do ano-calendário de 2023.

 

Importante ressaltar que a lei prevê que o IR deverá ser pago até 31/05/2024.

 

Por fim, há a previsão de que não poderão ser aplicados quaisquer deduções, percentuais ou fatores de redução à base de cálculo, à alíquota ou ao montante devido do imposto de que trata o art. 14.

 

  1. NOVO REGIME PARA FUNDOS DE INVESTIMENTO

 

Pela disposição da lei, a partir de 2023 os fundos de investimentos fechados, de modo semelhante ao que ocorre com os fundos abertos, estarão sujeitos à retenção do IRRF na sistemática de “Come-Cotas”, com alíquota de 15% ou de 20%, sendo essa última hipótese para os fundos de curto prazo.

 

A retenção na fonte ocorrerá no último dia útil dos meses de maio e novembro ou na data da distribuição de rendimentos, amortização ou do resgate de cotas, caso ocorra antes.

 

Nas regras de transição, há a previsão de que os rendimentos acumulados até 31/12/2023 serão sujeitos à incidência do IRRF à alíquota de 15%, sendo que respectivo imposto deverá ser retido pelo administrador do fundo de investimento e recolhido à vista até 31/05/2023 ou em até 24 parcelas mensais e sucessivas, com pagamento da primeira parcela até 31/05/2023.

 

De modo alternativo, o cotista residente no país pode optar por adimplir o IRRF sobre rendimentos das aplicações nos fundos de investimento à alíquota de 8%. O pagamento ocorrerá em duas etapas: (i) na primeira, o pagamento do imposto sobre os rendimentos apurados até 30/11/2023; (ii) na segunda, o pagamento do imposto sobre os rendimentos apurados de 1º de dezembro de 2023 a 31 de dezembro de 2023.

 

Na primeira etapa, o imposto deverá ser recolhido em 4 (quatro) parcelas iguais, mensais e sucessivas, com vencimentos nos dias 29 de dezembro de 2023, 31 de janeiro de 2024, 29 de fevereiro de 2024 e 29 de março de 2024. Já na segunda etapa, o recolhimento deverá ocorrer à vista, no mesmo prazo de vencimento do IRRF devido na tributação periódica de que trata o inciso I do caput do art. 17 desta Lei relativa ao mês de maio de 2024.

 

Em relação à retenção do IRRF na sistemática de “Come-Cotas”, nota-se que alguns fundos de investimento não serão submetidos à tributação periódica, tais como o Fundo de Investimento em Participações (FIP), Fundo de Investimento em Índice de Mercado (Exchange Traded Fund – ETF), com exceção dos ETFs de Renda Fixa e Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC).

 

No que se refere aos Fundos de Investimento Imobiliário (FII) e os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas do Agronegócio (Fiagro), a lei aprovada assegura uma isenção do imposto de renda sobre os rendimentos dos FIIs ou Fiagros que possuam, no mínimo, 100 (cem) cotistas.

 

Anteriormente, para que fosse concedido alíquota zero de IRRF nas distribuições pagas por esses fundos para pessoas físicas, a quantidade mínima era de 50 (cinquenta) cotistas. O prazo para adequar essa quantidade mínima de cotistas será até 30 de junho de 2024.

 

  1. Instrução Normativa nº 2.166/2023

 

Posteriormente à sanção da Lei 14.754/2023 sobre a tributação dos investimentos no exterior, a Receita Federal do Brasil publicou a Instrução Normativa 2.166, a qual dispõe sobre os rendimentos apurados até 31/12/2023 nas aplicações dos fundos de investimentos sujeitos à tributação pela sistemática do “come-cotas”.

 

Ao reiterar a Lei nº 14.754/23, a IN nº 2.166/23 dispõe que o IRRF que incidirá sobre o “estoque” de rendimentos à alíquota de 15%, deverá ser retido pelo administrador do fundo de investimento e recolhido à vista, até 31/05/2024 ou em até 24 parcelas mensais e sucessivas, com o pagamento da primeira parcela até 31/05/2024.

 

Os rendimentos consistem na diferença positiva entre o valor patrimonial da cota em 31/12/2023, incluídos os rendimentos apropriados a cada cotista, e o seu custo de aquisição.

 

No caso dos fundos sujeitos ao regime específico do art. 26 da Lei 14.754/2023, os quais são o FIP, o FIDC e o ETF de Renda Variável, o cotista poderá optar por não computar os valores controlados nas subcontas.

 

A lei ainda prevê que, de modo alternativo, a pessoa física residente no país poderá optar por pagar IRRF à alíquota de 8% e em duas fases: (i) na primeira etapa, correspondente aos rendimentos apurados até 30/11/2023, em 4 parcelas mensais e sucessivas com vencimentos nos dias 29/11/2023, 31/01/2023, 29/02/2024 e 29/03/2024; e (ii) na segunda etapa, em relação aos rendimentos apurados de 01/12/2023 a 31/12/2023, por meio de pagamento à vista, com prazo de vencimento até o último dia útil de maio de 2024.

 

Na hipótese do adimplemento não ser realizado nos prazos estipulados, a pessoa física residente no país ficará sujeita ao imposto pela alíquota de 15%.

 

A lei ainda dispõe que o cotista deverá fornecer os recursos financeiros necessários para o recolhimento do imposto, não sendo possível que o fundo efetue distribuições ou repasses de recursos aos cotistas até que haja a quitação integral do imposto.

 

Para afastar a sua responsabilidade em relação ao inadimplemento do imposto, transferindo-o para o cotista, o administrador deverá encaminhar à RFB o CPF ou CNPJ do contribuinte, o valor dos rendimentos que serviram de base de cálculo do imposto e a quantia de imposto devida.

 

Ademais, caso o cotista realize investimento no fundo por meio de amortização, resgate ou alienação de cotas antes do decurso do prazo do pagamento do IRRF, o vencimento do IRRF será antecipado para a data da realização.

 

Por fim, a IN estabeleceu que o imposto deverá ser declarado por meio de PGD e DCTF.

 

Os especialistas em Direito Tributário do Brasil Salomão e Matthes permanecem à disposição para eventuais esclarecimentos sobre essas novas regulamentações.

Autores do Artigo

  • Sócio
    fabio.calcini@brasilsalomao.com.br
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