Impactos da Reforma Tributária recém promulgada sobre as sociedades médicas – considerações preliminares
Impactos da Reforma Tributária recém promulgada sobre as sociedades médicas – considerações preliminares

Impactos da Reforma Tributária recém promulgada sobre as sociedades médicas – considerações preliminares

16/02/24

Como amplamente divulgado na mídia, ao final de 2023 foi promulgada a Emenda Constitucional (EC) nº 132, oriunda da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019, que trouxe, dentre outras disposições, sensíveis alterações na sistemática de tributos incidentes sobre o consumo.

 

O ponto principal é a unificação, a partir de 2033, de cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e COFINS), através de cobrança única, o denominado IVA (Imposto de Valor Agregado) dual, dividida entre os níveis federal – Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) – e estadual/municipal – Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

 

Nesse contexto, serão extintos o ICMS, o ISS, o PIS e a COFINS. O IPI, por sua vez, embora estivesse inicialmente previsto para ser extinto, permanecerá com nova função, tendo as alíquotas reduzidas a zero em todo o País, exceto com relação a produtos industriais da Zona Franca de Manaus.

 

A EC 132 também inseriu na Constituição Federal o denominado Imposto Seletivo, de competência da União, que incidirá sobre produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

 

Importante ressaltar que muitas disposições da EC 132 dependem de regulamentação. Portanto, as considerações aqui contidas são preliminares e não dispensarão estudo mais aprofundado sobre as regulamentações supervenientes. Inclusive as alíquotas de referência ainda não foram divulgadas, o que tem gerado muito debate sobre o aumento ou não da carga tributária, muito embora a própria emenda preveja um “teto de referência”, permitindo que em 2035 as alíquotas da CBS e do IBS sejam reduzidas, se constado aumento da carga tributária proporcionalmente ao PIB.

 

De qualquer forma, já é possível traçar um panorama sobre as principais implicações da reforma tributária especificamente sobre as sociedades médicas, alvo deste material.

 

Pois bem, ao que tudo indica, o setor de serviços em geral será um dos mais afetados, ainda que a EC tenha amenizado a situação ao prever que lei complementar definirá operações beneficiadas com redução de 30% das alíquotas da CBS e do IBS relativas à prestação de serviços de profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, desde que submetidas a fiscalização por conselho profissional (situação de advogados, médicos e contadores, por exemplo).

 

A atividade médica, por outro lado, terá redução de 60% das alíquotas da CBS e do IBS, conforme definição em lei complementar, uma vez que há previsão expressa de “serviços de saúde” e “dispositivos médicos” dentre as operações beneficiárias da alíquota reduzida.

 

Será essencial um estudo detalhado a partir das regulamentações, mas as clínicas médicas e sociedades uniprofissionais de saúde provavelmente experimentarão aumento de carga tributária. Consequentemente, o aumento será refletido nos preços praticados. Explicamos:

 

Via de regra, atualmente as sociedades médicas estão enquadradas no Lucro Presumido, recolhendo tributos federais na ordem de 0,65% ao PIS, 3% para COFINS, 4,8% para IR (alíquota de 15%, aplicada sobre base de cálculo de 32%), 2,88% de CSLL (alíquota de 9%, aplicada sobre base de cálculo de 32%), além do adicional de IR, quando aplicável. Outras sociedades podem ser equiparadas a hospitais (necessário cumprimento da RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA-RDC DA ANVISA Nº 50, DE 21 DE FEVEREIRO DE 2002, dentre outros requisitos), desde que estejam constituídas sob a forma empresarial e atendam a outros critérios legais, o que reduz a carga tributária incidente, partindo de uma base de cálculo presumida de 8% para IRPJ e 12% para a CSLL, em detrimento dos 32% aplicáveis a prestadores de serviços em geral. A carga tributária pode sofrer alterações se a pessoa jurídica for optante pelo Simples Nacional ou se estiver enquadrada no Lucro Real. Mas a regra geral é o enquadramento no Lucro Presumido, por ser mais vantajoso na maioria das situações.

 

Além dos tributos federais, as clínicas médicas recolhem o ISS, tributo municipal, que varia entre 2% e 5%, dependendo da previsão de cada município. Algumas sociedades podem não recolher o ISS sobre o faturamento, sujeitando-se ao recolhimento fixo, calculado por profissional, conforme previsão hospedada no Decreto-Lei nº 406/68, o que representa uma economia tributária relevante.

 

Admitido um IVA dual (CBS e IBS) entre 25,45% e 27,5% (estimativa mais recente do Ministério da Fazenda), com redução de 60% para serviços de saúde, a carga tributária sobre tais tributos será algo em torno de 10% e 11%, ou seja, um aumento se comparado com os atuais 8,65% recolhidos a título de PIS, COFINS e ISS (considerando a tributação pelo Lucro Presumido de sociedade simples, sem equiparação a hospitais, que recolhe o ISS na alíquota máxima de 5% sobre o faturamento). O aumento será ainda mais significativo para o caso de sociedades que recolhem atualmente o ISS fixo (Decreto 406/68), uma vez que o benefício, a rigor, deixaria de existir.

 

Os optantes pelo Simples Nacional (na realidade das sociedades médicas dificilmente mais vantajoso do que a tributação pelo Lucro Presumido, mas depende de cada caso) também podem ser afetados. O § 2º do art. 146, da Constituição Federal, incluído pela EC 132, faculta ao optante pelo regime único apurar e recolher a CBS e o IBS nos novos moldes, hipótese em que as parcelas referentes a cada tributo não serão computadas no recolhimento único. No entanto, optando por recolher a CBS e o IBS por meio do regime único, não será permitida a apropriação de créditos da CBS e do IBS. Na prática, dependendo do formato de cada negócio, pode haver um direcionamento para a opção pela tributação no novo formato. Evidentemente, cada situação deve ser avaliada de maneira individualizada.

 

As alíquotas destacadas acima são aproximadas, atribuídas apenas para fins didáticos, uma vez que a sociedade pode estar sujeita, atualmente, a carga tributária diversa, sem contar que a regulamentação da reforma tributária pode resultar em outros valores.

 

Em suma, conclui-se que muitas disposições da EC 132 dependem de regulamentação e, portanto, as considerações aqui contidas são preliminares, demandando análise mais aprofundada das regulamentações a serem expedidas. Mas, a princípio, as clínicas médicas e sociedades uniprofissionais de saúde, geralmente enquadradas no Lucro Presumido, provavelmente experimentarão aumento de carga tributária, sendo muito importante o planejamento e que sejam feitas simulações junto às assessorias jurídica e contábil.

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